Um belo dia você acorda com uma dor no pescoço. Uma dor nas costas. Seus olhos doem. Seus músculos doem. Você tem dificuldades para se lembrar das coisas, você tem dificuldades para acordar. Você tem dificuldades para dormir, dificuldades para emagrecer, dificuldades em chegar de um ponto ao outro, dificuldades em chegar ao ponto. Você perde o ponto, perde tempo, ganha rugas, ganha peso, ganha nãos. Os dias passam... Você respira fumaça. Bebe água contaminada. Queima a pele do seu rosto pelos raios catódicos do monitor, fuma um cigarro, toma mais um gole, se pergunta até que idade vai sobreviver... Pensa em mudar para o interior. Pensa em parar de beber. Pensa em comprar roupas novas. Pensa em matar alguém. Pensa em se matar... Um belo dia você acorda e se dá conta que está cansado... Cansado da cidade, dos carros, das luzes, do lixo, das pessoas, do barulho... Cansado de não saber para onde ir, cansado de não ter para onde ir e precisar ir para algum lugar... Cansado de não ter razão, de não ter caminhos, de não ter opções... Cansado de ver sua vida igual a de todos os outros, de ser só mais um rebanho sem pastor... Cansado de chefes, deuses, impostos, moda, dinheiro... Cansado da sensação de estar desperdiçando seu tempo, cansado de não ter tempo algum para desperdiçar... Você se cansa de viver em um mundo onde quem não está desesperado, está louco... Você se desespera com medo de enlouquecer... Respira fundo, toma outro gole... Você se cansa de não saber exatamente do que está cansado... Se cansa do “alguma coisa está errada” que paira sobre o ar desde uma época que você não se lembra. Se cansa das avenidas, das ruas, das alamedas, das praças, do sol, dos postes, das placas de sinalização, das buzinas... Você se cansa de amores incompletos, de amores platônicos, de falta de amor, de excesso disso e daquilo... Se cansa do “apesar de”. Se cansa do “rabo entre as pernas”, da sensação de vazio, se cansa do “a vida é assim mesmo”. Você se cansa de esperar, de rezar, de aguardar, de ter esperanças, cansa do frio na barriga, cansa da falta de sono... Você se cansa da hipocrisia, da falsidade, da ameaça constante. Se cansa da estupidez, da apatia, da angústia, da insatisfação, da injustiça, do frenesi, da busca impossível e infinita de algo que não sabe o que é... Se cansa da sensação de não poder parar... E você não para mesmo, até que esteja morto.